[Estes conselhos foram ditos por Padmasambhava para Yeshe Tsogyal]
Eu, o mestre Nascido do Lótus de Uddiyana,
Treinei no Dharma pelo meu bem-estar e pelo dos outros.
Ao leste de Vajrasana,
Eu estudei e me tornei instruído nos ensinamentos do Sutra.
Ao sul, ao oeste e ao norte,
Eu estudei as coleções do Vinaya, do Abhidharma
E os ensinamentos da Paramita.
Em Bhasudhara eu estudei Kriya.
Na terra de Uddiyana eu estudei Yoga.
No país de Zahor eu estudei as duas seções do Tantra.
Na terra de Ja eu estudei Kilaya.
No país de Singha eu estudei Hayagriva.
Na terra de Marutse eu estudei Mamo.
No Nepal eu estudei Yamantaka.
Em Vajrasana eu estudei Amrita.
As quatro seções do Tantra Pai e do Tantra Mãe,
Incluindo o Guhyasamaja,
Eu estudei na terra de Jala até alcançar erudição.
A Grande Perfeição eu aprendi de minha mente naturalmente desperta.
Eu realizei que todos os fenômenos são como um sonho, como mágica.
Na terra do Tibet eu realizei imensas ações pelo bem-estar dos seres.
Na era de degeneração eu beneficiarei os seres.
Para tanto eu escondi inumeráveis tesouros terma
Que irão encontrar as pessoas destinadas.
Todos vocês, afortunados que se conectam com estes termas,
Obedeçam o comando do Nascido do Lótus!
Assim ele disse.
Emaho! No fim desta era, meus tesouros terma florescerão nesta terra nevada do Tibet. Ouçam aqui, todos vocês que seguirão meus conselhos nesse tempo!
É difícil realizar a natureza da Ati Yoga da Grande Perfeição, então a treine! Esta natureza é o estado desperto da mente. Apesar de o seu corpo permanecer humano, sua mente chegará ao estágio do estado búddhico.
Não importa quão profundo, quão vasto ou quão abarcadores os ensinamentos da Grande Perfeição possam ser, todos eles estão incluídos dentro disto: não medite ou fabrique nem mesmo um átomo e não fique distraído nem mesmo por um instante.
Há o perigo de que as pessoas que falham em compreender isto usem este chavão: "Está tudo bem em não meditar!" Suas mentes permanecem presas pelas distrações do negócio samsárico, apesar de que quando realizarem a natureza da não-meditação, elas devam ser liberadas em igualdade do samsara e nirvana. Quando a realização ocorrer, você definitivamente deve estar livre do samsara, de modo que suas emoções perturbadoras naturalmente se acalmem e se tornem o despertar original. De que serve a realização que falha em reduzir suas emoções negativas?
Porém, algumas pessoas se entregam aos cinco venenos, evitando a meditação. Elas não realizaram a verdadeira natureza e certamente irão para o inferno.
Não professe uma visão que ainda não realizou! Já que a visão é vazia de ver, a essência da mente é uma expansão de grande vacuidade. Já que a meditação é sem meditar, deixe sua experiência individual livre da fixação. Já que a fruição é sem abandonar ou atingir, ela é o dharmakaya de grande êxtase. Estas quatro frases são palavras de meu coração. Contradiga-as e você falhará em descobrir a natureza do Ati Yoga.
No fim da era futura, haverá muitos praticantes pervertidos que tratarão o Dharma como mercadoria. Nessa época, todos aqueles que obedecem minhas palavras, não abandonem as dez atividades espirituais.
Apesar de a sua realização ser igual à dos buddhas, faça oferendas às Três Jóias. Apesar de você ter obtido maestria sobre sua mente, direcione suas metas interiores para o Dharma. Apesar de a natureza da Grande Perfeição ser suprema, não deprecie os outros ensinamentos.
Apesar de você ter realizado que os buddhas e os seres sencientes são iguais, abrace todos os seres com compaixão. Apesar de os caminhos e estágios estarem além do treinamento e da jornada, não deixe de purificar seus obscurecimentos através das atividades do Dharma. Apesar de as acumulações estarem além do juntar, não corte as raízes da virtude condicionada.
Apesar de a sua mente estar além do nascimento e da morte, este corpo ilusório morre, então pratique enquanto se lembra da morte. Apesar de você experienciar o dharmata livre do pensamento, mantenha a atitude da bodhichitta. Apesar de você ter atingido a fruição do dharmakaya, mantenha a companhia com sua divindade meditacional.
Apesar de o dharmakaya não estar em qualquer outro lugar, procure o verdadeiro significado. Apesar de o estado búddhico não estar em qualquer outro lugar, dedique qualquer virtude que criar à iluminação insuperável. Apesar de tudo o que é experienciado ser o buddha original, não deixe sua mente vaguear no samsara.
Apesar de a essência de sua mente ser o buddha, sempre venere o yidam e o lama. Apesar de você ter realizado a natureza da Grande Perfeição, não abandone sua divindade meditacional. Aqueles que, ao invés de fazer isto, falam tolamente com palavras orgulhosas, apenas prejudicam as Três Jóias e não encontrarão nem mesmo um instante de felicidade.
O mestre disse: Os seres humanos não pensam sobre a morte. A vida de um homem é como um monte de palha ou uma pluma sobre uma passagem de montanha. O demônio Senhor da Morte vem subitamente, como uma avalanche ou uma tempestade. As emoções perturbadoras são como a palha pegando fogo. O tempo de sua vida diminui como as sombras ao sol nascente.
Todos os seres sencientes dos três reinos emaranham-se na cobra negra auto-criada da raiva. Eles se cortam com os chifres do boi vermelho auto-criado do desejo. Eles se obscurecem com a densa escuridão auto-criada da estagnação. Eles se acorrentam no penhasco auto-criado da vaidade. Eles se destroçam com o chacal auto-criado da inveja. As pessoas não percebem que falharam em escapar das cinco perigosas máculas das emoções negativas. Elas fazem qualquer coisa para experienciar os prazeres samsáricos desta vida apenas.
Esta vida é cruzada em um breve momento, mas o samsara é infinito. O que você vai fazer na próxima vida? E o tempo desta vida também não é garantido: a hora da morte é incerta e, como um condenado levado à prancha, a cada passo você está mais próximo da morte.
Todos os seres são impermanentes e morrem. Você não ouviu falar das pessoas que morreram no passado? Você não viu qualquer um de seus parentes morrer? Você não percebeu que está ficando velho? E ainda assim, ao invés de praticar o Dharma, você se esquece da aflição passada. Ao invés de temer a miséria futura, você ignora o sofrimento dos reinos inferiores.
Perseguido pelas circunstâncias temporárias, amarrado pela corda da fixação dualista, exausto pelo rio do desejo, preso na teia da existência samsárica, mantido prisioneiro pelas apertadas algemas do amadurecimento kármico — mesmo quando as notícias do Dharma alcançam-no, você ainda se apega às diversões e permanece descuidado. A morte não acontece para pessoas como você? Tenho pena de todos os seres sencientes que pensam deste modo!
O mestre disse: Quando você mantém a mente na miséria do morrer, torna-se claro que todas as atividades são causas de sofrimento; então, abandone-as. Corte todos os nós, até mesmo o menor, e medite em solidão sobre o remédio da vacuidade. Nada mais irá ajudá-lo na hora da morte, então pratique o Dharma, já que ele é o seu melhor companheiro.
O seu mestre e as Três Jóias são a melhor escolta, então o quanto antes tome refúgio. Praticar o Dharma é o que mais ajuda o seu estado mental. Lembre-se do que você ouviu, já que o Dharma é o que é mais digno de confiança.
Não importa qual ensinamento você pratica, abandone o sentimento de sono, letargia e preguiça. Ao invés disso, vista a armadura da diligência. Não importa qual ensinamento você compreendeu, não se separe do seu significado.
Padmasambhava disse: faça assim se você quer praticar o Dharma! Mantenha em mente as instruções orais do seu lama. Não conceitualize suas experiências, pois isto o faz ficar apegado ou raivoso. Dia e noite, olhe para sua mente. Se o fluxo de sua mente contiver qualquer não-virtude, renuncie a ela a partir do núcleo de seu coração e exerça a virtude.
Acima de tudo, quando você vir outras pessoas cometendo o mal, sinta compaixão por elas. É inteiramente possível que você sinta apego ou aversão por certos objetos dos sentidos. Abandone isso. Quando você sentir apego por algo atrativo ou aversão por algo repulsivo, compreenda isso como uma delusão de sua mente, nada mais que uma ilusão mágica.
Quando vocês ouvir palavras agradáveis ou desagradáveis, compreenda-as com um ressoar vazio, como um eco. Quando você encontrar o infortúnio e miséria severos, compreenda-os como uma ocorrência temporária, uma experiência deludida. Reconheça que a natureza inata nunca está separada de você.
Obter um corpo humano é extremamente difícil, então é tolice ignorar o Dharma uma vez que ele é encontrado. Apenas o Dharma pode ajudá-lo; todo o resto é engano mundano.
Novamente o mestre disse: Os seres com karma inferior almejam a grandeza e vaidade deste mundo, e agem sem qualquer pensamento sobre o amadurecimento kármico. A miséria futura durará muito mais que a presente, então sinta amor e compaixão maternais pelos seres dos três reinos. Mantenha companhia constante com a mente desperta da bodhichitta. Abandone as dez não-virtudes e adote as dez virtudes.
Não considere qualquer ser senciente como inimigo: fazer isso é apenas sua delusão da mente. Não procure comida e bebida através das mentiras e do engano. Apesar de a sua barriga estar cheia nesta vida, ela estará pesada na próxima.
Não se envolva com negócios e fazer lucros; em geral, é uma distração tanto para você quanto para os outros. Não dê importância para a riqueza porque ela é o inimigo da meditação e da prática do Dharma.
Ficar apenas na comida é uma causa de distração; mantenha suas provisões de meditação simplesmente suficientes para sustentá-lo. Não viva em vilas ou áreas que promovam o apego e a aversão. Quando seu corpo estiver em exclusão, sua mente estará também. Abandone a conversa fiada e fale menos. Se vocês ferir os sentimentos dos outros, ambos criarão karma negativo.
Em geral, todos os seres sencientes sem exceção foram seus pais, então não se permita sentir apegado ou hostil. Mantenha um estado mental pacífico. Abandone a raiva e as palavras duras; ao invés disso, fale com um rosto sorridente.
A bondade dos seus pais não pode ser retribuída nem mesmo se você sacrificar sua vida, então seja respeitoso em pensamento, palavra e ação. Tanto a virtude quanto o mal vêm dos objetos e companheiros percebidos, então não mantenha companhia com aqueles que fazem o mal. Não permaneça em um lugar onde as pessoas são hostis diante de você e que aumentam a raiva e o desejo. Se você o fizer, isso apenas aumentará as emoções perturbadoras em você e nos outros.
Permaneça onde seu estado mental fique em tranqüilidade e a sua prática de Dharma progredirá automaticamente. Permanecer em lugares de extremo apego e aversão é apenas uma distração. Permaneça onde sua prática de Dharma se desenvolve.
Se você se tornar vaidoso, suas virtudes diminuirão, então deixe de ser arrogante e orgulhoso. Se você se tornar desapontado e sem coração, console-se e seja o seu próprio conselheiro. Reembarque sobre o caminho.
O mestre disse: Se você quiser genuinamente praticar o Dharma, faça o que é virtuoso, até mesmo a ação mais diminuta. Renuncie ao que é mal, até mesmo a menor ação. O maior oceano é feito de gotas d'água; até mesmo o monte Sumeru e os quatro continentes são feitos de pequenos átomos.
Não importa se o seu ato de generosidade é tão pequeno quanto uma única semente de gergelim; se você der com compaixão e bodhichitta, atingirá um mérito cêntuplo. Se você der sem a intenção da bodhichitta, seu mérito não aumentará mesmo se der cavalos e gado.
Não se entregue à lisonja nas amizades de meio coração. Permaneça honesto em pensamento e ação. A primeira prática do Dharma é manter a honestidade em pensamento e ação. O fundamento da prática do Dharma descansa sobre o samaya puro, a compaixão e a bodhichitta. Os samayas do mantra secreto, os preceitos do bodhisattva e as regras dos shravakas estão todos incluídos dentro disto.
O mestre disse: Use todos os seus suprimentos de comida e riqueza com atos virtuosos. Algumas pessoas dizem, "Precisa-se de riqueza na hora da morte." Mas quando você for golpeado por uma doença fatal, não poderá diminuir sua dor com o dinheiro, não importa quantos ajudantes você tenha, e sua dor não será maior se você não tiver coisa alguma.
Nessa hora não faz diferença se você tem ajudantes, servos, atendentes e riqueza. Todos são causas de apego. O apego amarra-o, até mesmo o apego à sua divindade e ao Dharma. O apego do rico às suas mil onças de ouro e o apego do pobre à sua agulha e linha são igualmente amarradores. Abandone o apego que bloqueia a porta para a liberação.
Quando você morrer, não importará se o seu corpo for cremado numa pira de sândalo ou consumido por pássaros e cachorros em um lugar despovoado. Você continua, acompanhado por quaisquer ações boas ou más cometidas enquanto estava vivo. Seu nome ruim ou sua boa reputação, seu estoque de comida e riqueza, e todos os seus ajudantes e servos são deixados para trás.
No dia em que você morrer, precisará de um lama sublime, então procure um [de antemão]. Sem um lama você possivelmente não pode despertar para a iluminação, então siga um lama qualificado e realize tudo o que ele comandar.
Novamente o mestre disse: Ouçam aqui, pessoas afortunadas dos tempos futuros que seguem as palavras de Padmakara! Antes de tudo, quando embarcar no caminho, você deve ser diligente. Por muito tempo no passado, você foi engrossado na experiência deludida; por incalculáveis éons, tudo o que você fez foi desviado na delusão. Corte completamente esta delusão bem agora, enquanto você obteve um corpo humano.
Todos os seres sencientes são obscurecidos pela escuridão do ignorante solo de tudo. Quando a experiência dualista surgiu, ela foi solidificada através da fixação dualista. Não importa o que os seres sencientes façam, eles cometem atos miseráveis. Esta prisão de delusão das seis classes de seres é muito apertada!
É extremamente difícil obter um corpo humano. Tendo obtido-o, apenas algumas pessoas ouvem o nome do Buddha. Após ouvi-lo, é extremamente raro que alguém sinta fé. E mesmo sentido fé uma vez, após entrar no Dharma muitas pessoas, como bestas obstinadas, quebram seus samayas e preceitos e dirigem-se em decadência. Vendo estes seres sencientes, os bodhisattvas desesperam-se e eu, Padmasambhava, preocupo-me.
Tsogyal, em um lugar onde os ensinamentos do Buddha estão presentes, as pessoas que obtiveram um corpo humano perfeito têm acumulado um mérito infinito há inumeráveis vidas, mas eles ainda possuem o karma completo das seis classes de seres.
Alguns deles, ao ouvirem as qualidades do Buddha, incendeiam-se de apego e raiva, atormentados sobre se outras pessoas se interessarão também. Tendo se juntado aos seguidores dos ensinamentos de Buddha, eles atormentam-se sobre se o samsara será esvaziado. Este tipo de apego e raiva é a semente para os reinos do inferno. Em vidas futuras essas pessoas nascerão em lugares onde nunca ouvirão o nome das Três Jóias.
Vocês que vivem agora ou que aparecerão no futuro, e que ouviram corretamente às palavras de Padmakara — isto é o que vocês devem fazer: A fim de aproveitar o corpo humano que obtiveram, vocês precisam do Dharma sublime. As pessoas que se apegam e anseiam pelo prestígio e fama mundanos ao invés de praticarem o Dharma pertencem ao nível mais elevado entre os animais.
Se você duvidar disto, então pondere cuidadosamente: ficar ansioso sobre se este corpo é confortável, se ele vai durar, se alguém vai triunfar, se os íntimos serão beneficiados, se os odiados inimigos serão retribuídos da mesma forma — todas estas são coisas que as pessoas mundanas possuem. Os pássaros no céu, os ratos na terra, as formigas que vivem sob as pedras e rochas, todos também têm as mesmas coisas. Todos os seres sencientes têm-nas.
Ter inimigos menos prejudiciais que os outros seres é simplesmente o nível mais elevado entre os animais. A fim de praticar o Dharma você deve perder totalmente o apego a um país. Sua terra natal e o lugar de nascimento do apego e da raiva.
Mantenha tanta comida e riqueza que seja suficiente de tomar e carregar. Faça isso até que você perca totalmente ao apego à comida e às roupas. Não mantenha posses que se tornem uma distração. Procure um lugar não freqüentado pelas pessoas selvagens. Mantenha a comida que seja simplesmente suficiente para sustentá-lo, viva em solidão, livre da companhia.
Primeiro, purifique seus erros. Depois, olhe para a sua mente! O fato de o estado natural da mente não durar, mas ainda sim projetar pensamentos, é uma prova de que é vazio. A ocorrência ininterrupta de pensamentos projetados é a sua claridade cognitiva. Não exerça a projeção de pensamentos. Não se apegue à claridade cognitiva. Ao relaxar sua atenção e reconhecer sua essência, sua consciência natural alvorece como o dharmakaya.
Às vezes, faça práticas para limpar as máculas e trazer melhoramentos. Se você puder seguir meu testamento deste modo, atingirá o estado de Vajradhara nesta mesma vida.
Tsogyal, alguém com uma forma marrom escura e irada aparecerá próximo do final dos ensinamentos de Shakyamuni. Por isso, esconda estas minhas palavras dentro de uma pequena caixa de pele de rinoceronte marrom.
Assim ele disse.
O testamento do mestre Nascido do Lótus de Uddiyana intitulado o Cravo de Jóia é completado aqui.
Isto foi revelado por Rigdzin Gödem, o Vidyadhara com a Penugem de Abutre, do tesouro branco ao leste.
Samaya, selado, selado.
Possa ser virtuoso.
Possa ser virtuoso.
Possa ser virtuoso.
Sarva Mangalam.
(Advice from the lotus born: a collection of Padmasambhava's advice to the dakini Yeshe Tsogyal and other close disciples. Introdução de S.E. Tulku Urgyen Rinpoche, tradução de Erik Pema Kunzang e edição de Marcia Binder Schmidt. Kathmandu: Rangjung Yeshe, 1994. Pág. 25-33.)
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