quinta-feira, 25 de julho de 2013

A Partida para a Índia

A Partida para a Índia

O mestre Padmakara [Padmasambhava] voltou sua atenção para os rakshasas que viviam em Lankapuri, a Terra dos Rakshasas, que é com um cabo de machado no continente de Jambu e que está próximo do país de Uddiyana. Ele viu que os rakshasas iriam invadir e destruir a Índia, o Nepal, o Tibet e assim por diante, destruindo a raça humana. O mestre Padma viu a necessidade de se defender contra os rakshasas a fim de conceder o presente do não-medo às pessoas do continente de Jambu. Ele decidiu deixar o glorioso Samye e ir ao topo da Gloriosa Montanha Cor-de-cobre.

Nesta hora, o príncipe Mutig Tsenpo e outros reis tibetanos, os ministros, os praticantes ordenados masculinos e femininos, os meditadores, yogis, curadores, copiadores e recitadores, governantes, mulheres, benfeitores masculinos e femininos — resumindo, todo o povo do Tibet — imploraram que ele permanecesse, mas ele não consentiu. Ao invés disso, ele cantou esta canção de aborrecimento com o Tibet.

Namo Ratna Guru

Senhor Amitabha e Avalokiteshvara,
Sua compaixão abarca todos os seres.
Concedam suas bênçãos para que eu possa ser o seu discípulo
E para que eu possa esvaziar o samsara.

Agora ouçam aqui, rei e súditos tibetanos.
Eu, Padmakara de Uddiyana,
Cheguei no Tibet devido à continuação do karma passado
E realizei a aspiração do rei [Trisong Detsen].

Nesta terra do Tibet, um reino encoberto por densa escuridão,
Fiz o sol do Dharma brilhar
E estabeleci todos os seres tanto na felicidade quanto no bem-estar.
E então o rei do Tibet faleceu.

Agora não devo mais permanecer no Tibet.
Eu e os tibetanos não entramos em acordo!
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu, o rei e ministros tibetanos não entramos em acordo!
Eles não governam o reino de acordo com o Dharma.
Ao invés disso, os ministros controlam o rei do Dharma.
Estou cansado dos reis que se engajam em maus atos.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu e os monges tibetanos não entramos em acordo!
Eles não mantém a disciplina pura,
Mas sim desfrutam, em segredo, de carne, vinho e mulheres.
Estou cansado de pessoas hipócritas.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu e os professores tibetanos não entramos em acordo!
Eles não explicam corretamente as palavras do Buddha e os tratados,
Mas sim enganam as pessoas com ensinamentos distorcidos.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu e os meditadores tibetanos não entramos em acordo!
Eles não misturam o estado de meditação com a pós-meditação,
Mas sim fazem do mero entendimento intelectual a sua experiência e realização.
Estou cansado dos praticantes que se fixam sobre a calma inerte.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu e os tantrikas tibetanos não entramos em acordo!
Eles não mantém puros os compromissos sagrados.
Ao invés disso, eles deixam tanto o Mahayana quanto o Mantra Secreto se desviarem no xamanismo.
Estou cansado dos violadores de samaya.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu e os yogis tibetanos não entramos em acordo!
Eles não possuem o significado da Visão e da Meditação em sua prática do Dharma,
Mas sim enganam a si mesmos com chavões orgulhosos.
Estou cansado de pessoas jactantes.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu e os governantes tibetanos não entram em acordo!
Eles não misturam os afazeres sociais com o Dharma divino,
Mas sim gastam os ensinamentos e o reino com más intenções.
Estou cansado de pessoas de mente ruim com intenções negativas.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Eu e os benfeitores tibetanos não entramos em acordo!
Eles não praticam a generosidade livre do prejuízo
Mas sempre criam causas para o renascimento entre os fantasmas famintos.
Estou cansado das pessoas enganadoras e mesquinhas.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

As mulheres tibetanas e eu não entramos em acordo!
Elas não têm fé e compaixão em seu coração,
Mas sim seguem os charlatões com fé oca.
Estou cansados das mulheres sem fé e luxuriosas.
Eu estou partindo; estou indo para a Índia!

Discípulos tibetanos, permaneçam em paz.
Eu estou partindo; estou indo para a terra dos rakshasas.
Rogo que nós possamos nos encontrar novamente no futuro.

Então todos os discípulos tibetanos se sentiram envergonhados de si mesmos. Com corações doloridos, com seus olhos cheios de lágrimas e atormentados pelo desespero profundo, eles fizeram prostrações completas. Eles colocaram os pés de Padmakara sobre o topo de suas cabeças, agarraram seu robe e rogaram, Ouça, grande mestre! Se você partir para a Índia, não teremos como esclarecer nossas concepções errôneas externas e internas! Anteriormente, quando o rei Trisong Detsen estava vivo, sua bondade era imensa. Agora, por favor continue a cuidar do povo do Tibet com sua compaixão. De todos os modos, por favor fique!

Em resposta ao pedido deles, o Mestre Padma disse: Durante o reino do rei [Trisong Detsen], fiz o Buddhadharma se espalhar e florescer. Vocês, meus seguidores, o rei [atual] e os súditos, devem manter minha tradição exatamente com ela é, como benfeitores e objetos de respeito. Já que estou indo para a Índia, não haverá qualquer um para esclarecer suas concepções errôneas externas e internas. Mas a menos que os rakshasas sejam banidos, eles inundarão sua terra, Lankapuri, e comerão todos os humanos do continente de Jambu. Chegou a hora de eu partir para subjugá-los, então preciso partir.

(Advice from the lotus born: a collection of Padmasambhava's advice to the dakini Yeshe Tsogyal and other close disciples. Introdução de S.E. Tulku Urgyen Rinpoche, tradução de Erik Pema Kunzang e edição de Marcia Binder Schmidt. Kathmandu: Rangjung Yeshe, 1994. Pág. 149-151.)

Instruções para Yeshe Tsogyal

Instruções para Yeshe Tsogyal

Depois de me dar predições visionárias, ele [Padmasambhava] se preparou para partir nos raios do sol, mas me curvando a ele, eu [Yeshe Tsogyal] o ofereci este lamento urgente:
Alas! Alas! Senhor de Uddiyana,
Aqui um momento, indo em seguida —
Certamente esta é a impermanência do nascimento e da morte.
Como posso prender o processo do nascer e do morrer?

Alas! Alas! Senhor de Uddiyana,
Estivemos juntos por tanto tempo
E agora, em um lampejo, estamos separados —
Isto certamente é o que significa o encontrar e o partir.
Como posso permanecer sempre com você?

Alas! Alas! Senhor de Uddiyana,
No passado, você permeou todo o Tibet,
Mas agora, apenas a marca de sua presença permanece —
Certamente isto é o que é chamado de impermanência.
Como posso prender os ventos do karma?

Alas! Alas! Senhor de Uddiyana,
No passado, seu conselho reforçou o Tibet,
Mas agora temos apenas a lenda para ouvir —
Certamente isto é o que é chamado de mudança e vir-a-ser.
Como posso obter a convicção inabalável?

Alas! Alas! Senhor de Uddiyana,
Até este momento, fui sua companheira constante,
Mas agora o mestre está desaparecendo no céu,
Deixando esta mulher na cama do karma ruim.
Quem me dará a iniciação e a bênção?

Alas! Alas! Senhor de Uddiyana,
Suas palavras foram cheias de instruções profundas,
Mas agora, imortal, você se dissolve no espaço,
Deixando para trás esta mulher atada ao corpo.
A quem posso pedir para dissipar obstáculos e me inspirar?

Alas! Alas! Senhor de Uddiyana,
Por favor me conceda três palavras simples de conselho.
Olhe sempre para mim com compaixão,
Por favor se lembre do Tibet em suas preces que realizam desejos.
Então joguei treze porções de pó de ouro sobre o corpo do mestre e, enquanto eu estava lamentando em aflição, o mestre, cavalgando os raios do sol, falou para mim a um palmo acima do solo, respondendo às minhas perguntas:
Ouça, ó filha, oceano de talento,
Padmasambhava está partindo para ajudar e converter os demônios selvagens.
Este ato hábil dos três modos do Buddha totalmente perfeito
Não podem ser comparados aos estouro das bolhas humanas.
Se você estiver com medo do nascimento e da morte, assimile o ensinamento do Buddha,
E quando você controlar seus fluxos de energia e os processos de criação e realização,
Você prenderá o processo do nascimento e morte da maneira mais superior.

Ouça, ó virtuosíssima, consorte fiel,
Padmasambhava está partindo para o bem de todos os seres.
A compaixão que tudo abraça e que não discrimina
Não pode ser comparada ao véu de delusão da humanidade.
Para estar comigo sempre, pratique o Guru Yoga
E as aparências idealizadas surgirão como o lama;
Não há melhor maneira de evitar o encontrar e o partir.

Ouça, ó senhora atraente e cativante,
Padmasambhava está partindo para a conversão abnegada dos outros.
Este ser supremo e imaculado, em quem a matéria se dissolveu,
Não pode ser comparada aos seres humanos dirigidos pelo karma ruim.
Preenchi o Tibet com discípulos e siddhas;
Medite sobre o mahamudra para obter o insight na impermanência
E o mundo fenomenal, samsara e nirvana, estará livre assim como ele é;
Não há melhor maneira para prender o vento do karma.

Ouça, ó senhora fiel, eternamente jovial,
Padmasambhava está indo ensinar nos reinos dos demônios selvagens.
Este supremo corpo-vajra, imune à mudança,
Não pode ser comparado ao ser humano golpeado pela doença.
Preenchi o Tibet, acima e abaixo, com o ensinamento do Buddha,
E se você o louvar e meditar, o ensinamento não será perdido;
O estudo, a contemplação e a meditação sustentam a doutrina do Buddha.
O bem para si e para os outros é espontaneamente realizado;
Não há maneira mais profunda de evitar a mudança e a decadência.

Ouça, ó fiel garota de Kharchen,
Padmasambhava está partindo para os campos da luz de lótus.
Inspirado pela aspiração dos sugatas do passado, presente e futuro,
Não posso ser comparado aos seres humanos perseguidos pelo senhor da morte.
Você, mulher, após atingir o siddhi, possui um "super-corpo";
Então, peça à sua mente superior pela bênção e iniciação:
Não há outro regente superior de Padmasambhava [além desta mente superior].

Ouça, ó Yeshe Tsogyalma,
Padmasambhava está partindo para o lugar do êxtase puro.
Esta divindade imortal, permanecendo em um corpo de vacuidade,
Não pode ser comparada aos seres humanos com corpo e mente divididos.
Tsogyal foi liberada pelos profundos preceitos secretos;
Medite sobre a grande perfeição para extinguir a corporealidade
E, através da absorção meditativa e das preces, dissipe os obstáculos e ganhe inspiração;
Não há melhor maneira de remover obstáculos à compaixão do lama.

Ouça, ó realizada Brilhante Luz Azul,
Dei a você muitos conselhos e instruções no passado,
Todos os quais comprimidos nesta injunção final —
Pratique o Guru Yoga.
Um palmo acima de sua cabeça, sobre um lótus e lua,
Em uma expansão de luz de arco-íris,
Senta-se Padmasambhava, o lama de cada um,
Com um rosto e duas mãos, segurando um vajra e um crânio,
Vestindo uma túnica, um colete, uma camisa e um xale,
Um xale externo e um manto solto,
Indicando sua completude perfeita dos seis veículos da prática,
Adornado com um chapéu, pena de abutre e brincos,
Em postura de lótus, irradiando luz,
Dotado com as oitenta marcas e sinais ideais,
No meio de dakinis vislumbrantes de luz quíntupla de arco-íris,
Brilhantes, incandescentes, claras com a luz da mente.
Quando esta visão estiver distinta, tome a iniciação e permaneça em absorção;
Se a visão não estiver clara, medite com diligência.
Então, conte o guru siddhi mantra essencial e quintessencial,
E finalmente, integrando o lama com as suas três portas,
Compartilhe o mérito e rogue para atingir a natureza do próprio lama,
E se banhe na esfera semente do potencial puro da grande perfeição.

Não há nada melhor do que isso, Tsogyalma,
E não há aumento ou diminuição de minha compaixão;
É impossível quebrar meu feixe de compaixão brilhando sobre o Tibet;
Estou sempre presente diante de meus filhos que rogam a mim;
Nunca estou separado dos fiéis.
Para as pessoas com conceitos, eu estou velado, apesar de fisicamente presente;
A compaixão contínua reforça meus filhos com a visão clara.
Assim, no futuro, no décimo da lua,
Padmasambhava virá cavalgando no senhor do dia,
Em formas pacíficas, enriquecedoras, dominadoras e destrutivas,
Durante os quatro quartos sucessivos do dia,
Para dar o siddhi correspondente aos meus filhos espirituais.
Do mesmo modo, aparecerei no décimo dia da lua minguante
Para realizar, em particular, todos os atos dominadores e destrutivos;
No décimo quinto dia da lua, cavalgando os raios da lua,
Moverei as profundezas do samsara com minha prece compassiva,
Esvaziando os reinos inferiores sem exceção,
Trabalhando perfeitamente com poder pelo bem dos outros.
No oitavo da lua, após a queda da noite e antes do amanhecer,
No pôr do sol e no nascer do sol, cavalgando meu sábio cavalo de batalha,
Viajando através dos lugares de poder do mundo,
Concederei vários siddhis:
Na terra das demônias viciosas, girarei a roda do ensinamento;
Para todos os seres das vinte e umas ilhas bárbaras
E das trinta terras mais selvagens,
Para pacificar, enriquecer, dominar ou destruir,
Emanando como fogo, vento ou água,
Como céu, arco-íris, terremoto ou trovão,
Despacharei um milhão de emanações para guiá-los para a felicidade;
Não haverá interrupção ao meu trabalho pelos seres.

Você, mulher, a partir daqui, viverá mais do que cem anos
Para atingir a felicidade para todos os seres do Tibet.
Após cem anos mais um, você poderá vir para Ngayab Ling
E, inseparável de Padmasambhava, protegerá seus discípulos.
"Detentora do Conhecimento Irradiando Luz Azul" será o seu nome
E para sempre o seu corpo, fala e mente serão unos comigo.
Tendo preso o processo de nascimento e morte, com os ventos do karma suprimidos,
Você projetará emanações para o bem dos seres futuros.
Na terra do Tibet, suas emanações continuarão para sempre,
Sem fadiga ou arrependimento, trabalhando belo bem-estar dos seres.
Assim seja composta, Tsogyalma!
Você e eu nunca nos separaremos.
Mas no plano relativo, adeus!
E através de minha prece compassiva, possa o Tibet ser feliz.

(Dowman, Keith. Sky dancer: the secret life and songs of the Lady Yeshe Tsogyel.
Ilustrado por Eva van Dam. Ithaca: Snow Lion, 1996. Pág. 126-131.)

A Mente Essencial

A Mente Essencial

O rei Trisong Detsen perguntou a Orgyen Rinpoche Padmasambhava: "Grande mestre, a fim de os seres sencientes causais realizarem o resultado do estado búddhico, bem no início a visão da realização é crucial. Então quem está dotado com a visão da realização?"

O mestre respondeu: "O ápice de todas as visões é constituído pelas instruções essenciais e práticas para a iluminação. Todas as galáxias, todos os sugatas dos três tempos e das dez direções e todos os seres sencientes dos três reinos são uma realidade: eles estão incluídos na mente essencial da bodhichitta. Isso que é chamado 'mente' é não-criado e se manifesta de vários modos."

"Bem, então, qual é a diferença entre os buddhas e os seres sencientes?"

"Nenhuma além de sua realização e não-realização da mente. Desconhecido para você, o Buddha está presente dentro de você. Devido à falha em reconhecer a natureza essencial da mente, você vaga entre os seis estados da existência."

"Bem, então, qual método há para penetrar a mente?"

"Para isso, as instruções práticas de um lama são necessárias. A assim-chamada 'mente' existe como uma experiência da atenção e do conhecimento. Não observe a mente externamente, mas sim internamente. Procure a mente com a mente. Estabeleça a mente em si com a mente. Observe: onde a mente inicialmente surge, onde ela está localizada agora e aonde ela vai no final? Quanto a isto, observando por você mesmo a sua mente, nenhum lugar de origem, nenhuma localização e nenhum destino são encontrados. Não há como indicar sua natureza essencial dizendo, 'É deste modo...' Assim, não tendo exterior ou interior, e não tendo observador ou observado, a mente é a grande sabedoria primordial, livre de centro ou periferia, grande, vazia, sabedoria primordial, originalmente livre e permeando tudo. A sabedoria primordial, que é naturalmente presente em seu próprio modo de ser, não é algo criado. O reconhecimento da presença da sabedoria primordial em você mesmo é a visão. Esforce-se para penetrá-la!

"O solo e o que tem o solo é como o espaço, primordial e espontaneamente presente. É como o sol, não tendo base para a escuridão da ignorância. É como um lótus, não-manchado pelas máculas. É como o ouro, que não muda da natureza da realidade em si. É como o oceano, sem movimento. É como um rio, sem interrupção. É como uma presença, sem encontrou ou partida. É com o Monte Meru, sem se mover ou mudar."

(Citado em Naked awareness: Practical instructions on the union of Mahamudra and Dzogchen.
Karma Chagme, com comentário de Gyatrul Rinpoche, traduzido por B. Alan Wallace,
editado por Lindy Steele e B. Alan Wallace. Ithaca: Snow Lion, 2000. Pág. 109-110.)

Do Tesouro de Jóias Preciosas para Eliminar Máculas

Do Tesouro de Jóias Preciosas para Eliminar Máculas

No eremitério de Samye Chimpu, a senhora Tsogyal, princesa de Kharchen, implorou ao mestre Padmakara [Padmasambhava]: Por favor preste atenção, grande mestre! Apesar de você ter mostrado a uma garota não-inteligente como eu que todo o mundo e os seus seres são o dharmakaya, ainda assim minha prática do Dharma desvia-se no entendimento teórico devido à minha companhia contínua com o hábito da percepção deludida. Imploro a você: conceda bondosamente sobre mim a instrução para me permitir juntar qualquer coisa que eu faça com a natureza inata do dharmakaya!

Padmasambhava respondeu: Tsogyal, ouça! Você deve possuir estes três pontos chave quando praticar os ensinamentos do Mantra Secreto do grande veículo — o ponto chave do corpo, a postura; o ponto chave dos olhos, o olhar; e o ponto chave da mente, o modo de descansar.

Antes de tudo, em um lugar recluso, sente-se na posição de pernas cruzadas sobre um assento confortável, descanse seus braços e estique sua coluna. Se o seu corpo permanecer em seu estado original, a meditação ocorrerá naturalmente. Sem assumir a postura física, a meditação não acontece.

Em seguida, quanto ao olhar, não feche seus olhos, nem pisque ou olhe para os lados. Olhe diretamente e sem oscilar para frente. Já que a visão e a consciência compartilham uma única natureza, a meditação ocorre naturalmente. Sem o olhar correto, a meditação não acontece.

O ponto chave da mente é não deixar o estado natural de sua mente ordinária seguir padrões habituais passados, não deixá-la olhar para as atividades futuras das emoções perturbadoras e não deixá-la fabricar qualquer coisa no seu estado presente através da conceitualização. Descansando a consciência em seu estado natural, a meditação ocorre naturalmente. Se você estiver distraída ou difusa, a meditação não acontece.

Quando você deixar suas três portas descansarem em seu estado natural deste modo, todos os pensamentos grosseiros e sutis se acalmam e sua mente permanece solta em si mesma. Isso é chamado Shamatha, descansar calmamente. [Quando sua mente está] não-obstruída, sem localização e nua na lucidez espontânea, [isso é chamado Vipashyana]. Quando estes dois, em um instante consciente, permanecem vivamente claros como uma identidade indivisível, isso é chamado Shamatha inseparável de Vipashyana. Entendimento Intelectual é quando você mantém a consciência como um objeto; Experiência é quando você descobre sua não-localização; e a Realização ocorre quando estes estados de mente permanecem vivamente claros como a essência de sua prática de meditação. Isto não é diferente da realização dos buddhas dos três tempos. Não é uma fabricação baseada nas instruções profundas do lama, nem um resultado da inteligência aguda do discípulo. É chamado de chegar ao estado natural da Base.

Quando meditar deste modo, surgirão as experiências [tib. nyam] de Êxtase, Claridade e Não-Pensamento.

A consciência livre do pensamento conceitual é chamada Não-Pensamento e tem três tipos. "Nenhum pensamento bom" significa livre de apego ao meditar e ao objeto de meditação. "Nenhum pensamento ruim" é a interrupção do fluxo de pensamento conceitual grosseiro e sutil. "Nenhum pensamento neutro" é o reconhecimento da face natural do estado desperto como sendo sem localização.

Durante este estado de não-pensamento, a Claridade é não-obstruída, radiação nua do estado desperto. Há três tipos de claridade. "Claridade espontânea" é o estado de ser livre de um objeto. A "claridade original" não aparece por uma duração temporária. A "claridade natural" não é feita por ninguém.

Há quatro tipos de Êxtase. O "sentimento de êxtase" é livre das condições adversas de desarmonia. O "êxtase completo" é livre do apego à fixação dualista. O "êxtase incondicionado" é livre de causas e condições.

Quando estes três tipos de experiência surgirem, você precisará das três analogias do desapego: o desapego ao êxtase é como um louco; o desapego à claridade é como o sonho de uma criança pequena; e o desapego ao não-pensamento é como um yogi que aperfeiçoou sua disciplina yógica. Quando você possui estes três, você está livre dos defeitos da meditação.

Se você se fascinar e se apegar a estas três experiências passageiras, você se desviará para os três estados da existência. Quando se apega ao Êxtase, você se desvia para o reino do desejo; quando se apego à Claridade, você se desvia para o reino da forma; e quando se apego ao Não-Pensamento, você se desvia para o reino sem forma.

Mesmo que você pense que não está nem apegada nem agarrado a eles, você mantém um sutil apego interno. Para cortar esta armadilha, há os Nove Estados Serenos da Permanência Sucessiva, começando com os Quatro Estados Dhyana da Serenidade para descartar o pensamento do desejo. O primeiro dhyana é livre do pensamento conceitual de percebedor e percebido, mas ainda está em discernir um objeto e um ato de meditação. O segundo dhyana é estar livre do pensamento conceitual e do discernimento, enquanto ainda se fixa em experimentar o sabor do samadhi da alegria. O terceiro dhyana é atingir uma mente inamovível mas com inalação e exalação. O samadhi do quarto dhyana envolve se tornar totalmente livre do pensamento conceitual com a não-obstruída percepção clara.

Os Quatro Estados Sem Forma da serenidade eliminam o pensamento conceitual do reino da forma. Permanecendo no pensamento de que "todos os fenômenos são como o espaço", você se desvia na [esfera de percepção do] Espaço Infinito. Permanecendo no pensamento de que "a consciência é infinita e sem direção", você se desvia na Consciência Infinita. Permanecendo no pensamento de que "a cognição clara da percepção não está presente, nem ausente, e não pode ser transformada num objeto do intelecto", você se desvia na Nem Presença Nem Ausência. Permanecendo no pensamento de que "esta mente não consiste de qualquer entidade, é não-existente e vazia", você se desvia na esfera de percepção do Nada Mais. Estes estados possuem a mácula sutil de serem conceitualizações, fascinações mentais, e experiências da mente dualista.

A serenidade da cessação descarta os conceitos de todos estes estados. A cessação analítica é o cessar do engajamento das seis consciências com seus objetos, o que envolve descansar calmamente na interrupção do movimento da respiração e da mente dualista. A cessação não-analítica é chegar à sua natureza inata. Essa é a indiferença última.

Entre os Nove Estados de Serenidade, os Quatro Estados Dhyana são "o Shamatha que produz Vipashyana". Assim o samadhi destes quatro dhyanas está em harmonia com a natureza inata e é o mais eminente de todos os tipos de samadhi mundano.

Os Quatro Estados Sem Forma da serenidade são as armadilhas do samadhi. A serenidade da cessação é o samadhi pacífico de um ouvidor.

Reconhecendo estes estados você pode distinguir os diferentes tipos de samadhi, purificar as máculas em sua prática de meditação e evitar se desviar.

Os Cinco Caminhos estão incluídos dentro de três. Tendo cortado estas armadilhas e praticado uma meditação sem defeitos, você permanece serena e vivamente no Êxtase, Claridade e Não-Pensamento durante o estado de meditação. No estado de pós-meditação, as aparências surgem não-obstruidamente e são tão insubstanciais quando um sonho ou uma ilusão mágica. Você entende a natureza da causa e efeito, preenche a medida de mérito até o borda, atinge o "calor do samadhi" e assim aperfeiçoa o Caminho da Acumulação.

Praticando assim durante um longo tempo, você vê na realidade, sem localização e auto-cognitiva, a natureza presente em você mesma. Reconhecer sua face natural é o Caminho da Visão. Experienciando a aparência, o estado desperto e a vacuidade como sendo sem localização, você vê diretamente a incondicionada natureza inata. A obstrução das emoções perturbadoras é destruída em sua raiz. Realizando a causa e efeito são vazios, o samsara não tem existência sólida. Isto é chamado o primeiro estágio [do bodhisattva, o estágio] do Alegre. O estado de meditação é indivisível do estado búddhico e tudo no estado de pós-meditação surge como uma ilusão mágica.

Familiarizando-se com este estado e o sustentando firmemente, todos os fenômenos tornam-se não-duais. Reconhecendo-os como uma auto-exibição, as aparências e a mente fundem-se em um. Quando a vacuidade surge como causa e efeito, você realiza a originação dependente. Durante o estado de meditação todos os fenômenos são sem localização e presentes como a essência do estado desperto. A presença sutil das aparências objetivos durante o estado de pós-meditação é o Caminho do Cultivo.

Mantendo isto durante um longo tempo, você realizará que todos os fenômenos do samsara e do nirvana são não-duais, além do surgimento e da cessação, não-misturados e completamente perfeitos, sem localização e auto-cognitivos. O obscurecimento cognitivo desaparece totalmente e o próprio momento em que tudo desponta como a lucidez original é o Caminho da Consumação, o estado búddhico.

(Advice from the lotus born: a collection of Padmasambhava's advice to the dakini Yeshe Tsogyal and other close disciples. Introdução de S.E. Tulku Urgyen Rinpoche, tradução de Erik Pema Kunzang e edição de Marcia Binder Schmidt. Kathmandu: Rangjung Yeshe, 1994. Pág. 68-72.)

Khatag, a Echarpe da Felicidade

Khatag, a Echarpe da Felicidade

Conta-se que o rei do Tibet [Trisong Deutsen], que não era buddhista, andava muito ressentido com o respeito e a veneração que o povo do Tibet mostrava para com o grande mestre indiano Padmasambhava. Parecia-lhe, na verdade, que reverenciavam mais a Padmasambhava do que a ele mesmo. Assim, o rei decidiu assegurar-se que, quando o grande mestre o visitasse, todos os chefes do país veriam aquele a quem tanto honravam render homenagem a seu rei.

No dia da visita de Padmasambhava, todos os cortesãos foram congregados para vê-lo render homenagem ao rei; este, com grande ansiedade, também esperava para conhecer o grande mestre. O altivo rei mal pôde ocultar o seu grande prazer quando Padmasambhava levantou os braços como que para prostrar-se diante do trono real; mas, ao invés disso, das mãos de Padmasambhava saíram chamas que alcançaram as roupas do rei, queimando-as em segundos. Enquanto os cortesãos tratavam de apagar as chamas a golpes, o rei, sufocado pela fumaça que subia de sua echarpe cerimonial, retirou-a dos ombros. Comprovando o grande poder do mestre o rei lançou-se aos pés de Padmasambhava em submissão, e lhe ofereceu a echarpe em sinal de humildade. Padmasambhava aceitou a echarpe, mas logo a devolveu ao rei, colocando-a ao redor do seu pescoço, como um signo de bênção e da vitória da autoridade sacerdotal sobre o poder temporal.

E assim, diz-se no Tibet, terra de poucas flores, que Padmasambhava estabeleceu o oferecimento de khatags de felicidade, como demonstração de respeito.

Khatag é uma tira comprida de tecido, geralmente branca, uma espécie de longa echarpe, que pode ser confeccionada com diferentes tipos de tecido, desde a seda até gaze atesada com pó de arroz. Literalmente significa "tecido que une" e simboliza o laço que se estabelece entre aquele que a oferece e o que a recebe.

(Jayang Rinpoche. Contos populares do Tibete: os mais belos diálogos da literatura budista.
Traduzido por Lenis. E. Gemignani de Almeida. São Paulo: Landy, 2000. Pág. 45-46.)

Conselhos Essenciais ao Rei Trisong Detsen

Conselhos Essenciais ao Rei Trisong Detsen

Emaho! Grande rei, por favor me ouça:
Não há essência nos afazeres mundanos.
Ao invés de se revolver infinitamente no ciclo de sofrimentos, de novo e de novo,
Tenha certeza de atingir o reino duradouro do rei Dharmakaya.

Realize a essência dos objetos, a esfera última não-nascida.
Vague na essência do lugar, a solitude nas florestas.
Olhe para a essência dos eremitérios, a natureza última, [a união de] claridade e vacuidade.
Descanse na essência da casa, a natureza inata da mente.
Prepare da essência da cozinha, a natureza inata da mente.
Desenvolva a essência do tesouro, a dupla bodhichitta.
Tenha a essência da riqueza, as duas acumulações.
Esforce-se na essência dos méritos, os dez atos virtuosos.
Tenha a essência da paternidade, compaixão pelos seres.
Sustente a essência da maternidade, a natureza da vacuidade.
Tenha a essência dos filhos, a inseparabilidade dos estágios de desenvolvimento e completude.
Medite sobre a essência da esposa, a claridade, êxtase e não-pensamento.
Olhe para a essência dos amigos, os ensinamentos do sugata [Buddha].
Observe a essência da mandala, a claridade imutável.
Obedeça à essência dos ensinamentos, domar a própria mente.
Veja a essência da Visão, a claridade e vacuidade imutáveis.
Descanse na essência da Meditação, a natureza da mente, como ela é.
Desmanche as delusões dualistas, a essência das Ações.
Realize a essência dos resultados, a perfeição espontânea sem esforços.
Então você será feliz tanto nesta vida quanto na próxima
E rapidamente atingirá o estado búddhico.

Quando a hora chegar, se você seguir meus conselhos, aceite o dharmadhatu como seu país essencial e deixe sua terra natal.
Adira aos retiros nas florestas e lugares remotos como seu lugar de permanência essencial e deixe sua casa para trás.Pratique o dharmata vazio e luminoso como sua meditação essencial e permaneça em reclusão.
Como sua casa essencial, permaneça no dharmadhatu ilimitado.
Como seu conhecimento essencial, mantenha a atenção e a presença da mente e se esforce na prática espiritual.
Como seu tesouro essencial, junte a riqueza dos três kayas na natureza básica da mente iluminada.
Como seu mérito essencial, não deixe seu corpo, fala e mente na ordinariedade, mas sim pratique o Buddhadharma sublime.
Como seu conselho essencial, confie nas palavras do Sugata e de seus lamas.
Como sua paternidade essencial, preste respeito a Samantabhadra, compaixão, e seja bondoso com todos os seres.
Como sua maternidade essencial, preste respeito a Samantabhadri, bondade amorosa, e estime todos os seres como seus próprios filhos.
Como sua esposa essencial, medite sem distração sobre o samadhi da luminosidade e vacuidade, e mantenha companhia constante com ela.
Como sua prole essencial, copie as escrituras dos Sugatas, e escrutine e mantenha seu significado em mente.
Como sua fazenda essencial, cultive o campo da fé e se engaje nas ações que estão em harmonia com o Dharma.
Como seu séqüito essencial, mantenha-se com dakinis e protetores, e os presenteie com oferendas de festa e com tormas.
Como sua comida essencial, coma do néctar não-surgido do dharmata e pratique o samadhi imutável.
Como suas bebidas essenciais, beba do néctar das instruções orais de seu lama e suplique a ele repetidamente.
Como sua roupa essencial, receba as iniciações e os compromissos sagrados e os leve à perfeição.
Como seu entretenimento essencial, engaje-se no samadhi da emanação e absorção e treine na expressão do estado desperto.
Como seu deleite essencial, pratique a meditação e a sadhana, e leve seu corpo, fala e mente à maturidade através dos estágios progressivos da prática do Dharma.
Como seu espetáculo essencial, treine gradualmente no desenvolvimento e completude, e os aplique na prática.
Como seu espírito guerreiro essencial, faça oferendas constantes à divindade de sabedoria.
Como seu capelão de corte essencial, visualize o mestre-vajra no topo de sua cabeça e suplique a ele.
Como sua atividade essencial, tenha as escrituras copiadas e as dê a quem quer que precise delas.
Como seu espelho essencial, olhe para o Dharma sagrado e se esforce em fazer súplicas.
Como seu templo essencial, medite sobre o seu corpo como sendo a mandala e visualize a divindade meditacional.
Como seu ornamento essencial, treine nos quatro imensuráveis e aja pelo bem-estar dos seres, sem parcialidade ou prejuízo.
Como sua prática de Dharma essencial, descanse sua mente no não-fabricado estado inato da vacuidade e luminosidade.
Como seu samaya essencial, olhe constantemente para a sua mente e revele a pureza de sua natureza.
Como sua instrução essencial, mantenha seu caráter livre do engano e da hipocrisia, e medite sobre o conselho oral da linhagem do ouvir.
Como sua mandala essencial, incessantemente descanse a sua mente no estado inato.
Como sua visão essencial, olhe para o dharmakaya imutável e reconheça seu rosto natural.
Como sua meditação essencial, pratique a divindade meditacional do não-surgimento e se torne estável no estado inato.
Como sua conduta essencial, aja sem aceitar ou rejeitar e seja livre do apego.
Como sua fruição essencial, não procure o resultado em qualquer lugar, já que os três kayas estão inerentemente em você mesmo.
Se você praticar de acordo com isto, atingirá o estado búddhico em Sukhavati após esta vida, nascendo dentro do botão de uma flor de lótus.

Assim Padmakara deu esta profecia ao rei Trisong Detsen.


(Advice from the lotus born: a collection of Padmasambhava's advice to the dakini Yeshe Tsogyal and other close disciples. Introdução de S.E. Tulku Urgyen Rinpoche, tradução de Erik Pema Kunzang e edição de Marcia Binder Schmidt. Kathmandu: Rangjung Yeshe, 1994. Pág. 141-142.)

A CONDIÇÃO NATURAL


A CONDIÇÃO NATURAL
Ou como as coisas são e como a confusão as faz aparecer

de Padmasambhava

Texto extraído do livro
"La Simplicité de la Grande Perfection"
Traduzido do tibetano e apresentado por James Low
Traduzido para o português por: Karma Tenpa Dhargye



INTRODUÇÃO
Este texto é uma seção do [gSang-sNgags Lam-Rim] de Padmasambhava, que existe ao mesmo tempo na linhagem aberta [bKa’-Ma] e na linhagem dos tesouros [gTer-Ma]. A linguagem é muito técnica e hermética, e ele condensa uma grande quantidade de informações em segundo plano. Poderíamos dizer que se trata de uma série de aforismos que constroem um raciocínio e um ponto de vista. Essas afirmações não são evidentes em si mesmas de um ponto de vista comum, e elas não são tampouco explicadas ou justificadas. Mas não é um tratado filosófico racional, lógico; é uma experiência real de Padmasambhava, o grande yogui dzogchende Oddiyana. Esse texto aparece no"Byang-gTer Chos-sPyod"e ele é recitado cada dia para os monges, osyoguise os laicos que seguem esta linhagem.
A compreensão da Base comum do samsara e do nirvana é essencial para a visão dzogchen e, nesse curto texto, a formação do samsara é claramente exposta: a ignorância é adventícia, ela não é inata, é uma nuvem passageira que vela a verdadeira natureza da mente semelhante ao céu, mas não a altera. Reconhecendo as qualidades da condição natural, se torna mais fácil identificar as diferentes manifestações do estado de extravio ou experiência do samsara. É interessante comparar isso com as experiências tradicionais, mais lineares, dos doze nidanas (doze elos). O texto ilustra o valor da visão, não enquanto filosofia iluminadora ou outra visão mística mais elevada, mas como um meio muito prático, muito eficaz, de reconhecer um desvio na meditação. O texto expõe a visão que deveria ser reconhecida. Isso corresponde ao primeiro dos três celebres aforismos de Garab Dordje, e a descrição do desenvolvimento da ignorância – ou falta de consciência – fornece o pano de fundo essencial ao segundo e terceiro célebres "pontos". [...]
As reações habituais aos fenômenos e às experiências que temos provêm da ignorância ou ausência de presença. Esta compreensão enquadra a existência comum, a deslocando da falsa verdade relativa para a pura verdade relativa. Compreender a fonte de nossa experiência comum nos permite ir mais fundo, e perceber esta fonte relativa que é a ignorância, até que penetremos na fonte absoluta que é o reino natural da consciência. É o nível mais elevado de redimensionamento, um estado aberto, sem moldura que põe em evidência o fato de que todos os quadros de referência são montagens. Nada deve ser trocado ou alterado de nenhuma maneira. É talvez nossa experiência ‘do que é’ que se aperfeiçoa quando nos liberamos das fabricações artificiais e quando permitimos à luminosidade natural e à claridade da existência de revelarem-se por si mesmas.
A CONDIÇÃO NATURAL
E O ESTADO DE EXTRAVIO

O TEXTO
A CONDIÇÃO NATURAL
No que concerne a condição natural,"ela é não dual, surgindo espontaneamente, pura desde o início, é a budeidade primordial".
(Padmasambhava comenta agora sua própria afirmação)
Há quatro aspectos disso:
- Primeiro, a condição natural permanece na não-dualidade.
Há cinco aspectos disso:
  1. Tudo o que aparece é despido de verdadeira realidade e desse fato, a essência é a não-dualidade das aparências e da vacuidade.
  2. A mente em si é não-nascida (inata) desde o início, o que é que faz cessar o não-nascido? Desse fato, há a característica da não-dualidade de começo e fim.
  3. Tudo que aparece é nossa própria mente e não há outros fenômenos que aqueles que provém da mente. Desse fato, a aparência e experiência são não-duais.
  4. No que concerne a mente de aparência não-dual, se não a possuíssemos anteriormente, ela não poderia aparecer depois. Como foi assim desde o início, a condição natural é a não-dualidade de si e do outro.
  5. Desta maneira, não há nenhum fenômeno que não seja não-dual, assim é essa grande não-dualidade.
Brevemente, após a realidade exposta, o sujeito, todos os fenômenos do samsara e do nirvana, tudo o que pode aparecer surge sem cessar, assim a não-dualidade está livre de limitações.
A não-dualidade é introduzida desse modo afim de que eliminando as idéias falsas, sejamos liberados do apego à crença nos fenômenos dualistas separados. O objetivo é a realização da não-dualidade. Todos os fenômenos podem ser englobados no duplo aspecto da essência (não-dualidade das aparências e vacuidade) e eles são não-duais, permanecendo somente em um único ponto [Thig-le Nyag-gChig].
- Segundo, a condição natural permanece enquanto que aparência despida de esforço.
Há cinco aspectos disso:
  1. A característica de todo fenômeno é ser desprovido de qualquer realidade substancial e assim a realidade surge sem esforço.
  2. Todos os fenômenos são uma energia de nenhum modo bloqueada e assim o sujeito surge sem esforço.
  3. A verdadeira natureza de todo fenômeno está além da compreensão e assim a não-dualidade surge sem esforço.
  4. O estado não foi produzido por nenhum outro. Desde o início, ele é o mesmo e assim sua natureza aparece sem esforço.
  5. Todos os fenômenos do samsara e do nirvana surgem sem esforço e não há nenhuma parte de qualquer fenômeno que não tenha essa natureza. Portanto, é a grande aparência sem esforço.
Brevemente, na realidade aberta, o sujeito – todos os fenômenos que podem aparecer nosamsarae nonirvana– não residem em nenhuma natureza própria real, assim eles surgem sem esforço e sem nenhuma limitação.
A aparência sem esforço é introduzida desse modo afim de que eliminando a falsa idéia, sejamos liberados do desejo de que um outro alguém possa nos ajudar (à atingir a iluminação).
O objetivo é ser livre da necessidade de buscar e de praticar. A essência desta realização é que todos os fenômenos, que são todas as aparências possíveis do samsara e do nirvana, surgem sem esforço na mente.
  • Terceiro, a condição natural permanece enquanto que Base pura [gZhi].
  • Há igualmente cinco aspectos disso:
  1. Sendo naturalmente vazia desde o início, ela é pura de todo fenômeno substancial e, desse fato, é a esfera muito pura [dByings].
  2. Enquanto experiência, a energia da vacuidade é incessante, assim, desde o início, houve a pureza em relação a aparência real da mente. É a cognição primordial muito pura.
  3. Na essência dotada da não-dualidade da aparência e da vacuidade, todos os fenômenos separados são puros desde o início. É a não-dualidade muito pura.
  4. Este estado não foi criado subitamente mas está presente desde o início. É a pureza natural.
  5. Não há nenhum outro fenômeno que não seja puro desde o início. É a grande pureza.
Brevemente, a realidade aberta – o sujeito, todos os fenômenos possíveis do samsara e do nirvana– não comporta nada que deva ser rejeitado, também é naturalmente pura. Portanto, é a pureza ilimitada.
A pureza perfeita é introduzida desse modo afim de que eliminando a idéia falsa, sejamos liberados do apego ao fato de crer que a confusão é um estado natural da mente. O objetivo é a realização da pureza perfeita. A essência-realidade é naturalmente e completamente pura.
  • Quarto, a condição natural reside na budeidade primordial.
Nossa própria consciência é a mente desperta que está purificada [sangs] da confusão dos fenômenos dualistas e que tem o desenvolvimento [rGyas] da cognição primordial não-dual.
Portanto, isso é a budeidade [Sangs-rGyas].
Ainda mais, ela não tem um átomo de confusão, pois é pura [Sangs], porque não é que ela tenha sido alguma vez sem não-dualidade e que a não-dualidade tenha sido desenvolvida [rGyas] mais tarde. Sua característica natural é estar livre da confusão, como a essência se desenvolve enquanto cognição primordial não-dual. É a budeidade primordial.
A natureza aberta é o modo natural. A expressão espontânea da claridade é o modo radiante. A não-dualidade desta claridade e desta vacuidade é o modo de manifestação.
O que é a natureza vazia, e como aparece a claridade da expressão natural? Claridade e vacuidade são não-duais ou indissociáveis enquanto cognição primordial desta compreensão.
Estar sem confusão diante desta verdadeira natureza, é a renúncia perfeita. Ter a não-dualidade desta essência, é a realização perfeita. Se não houvesse uma tal budeidade primordial, a meditação não poderia fazê-la aparecer.
É como a pedra Saledram que não teve nunca ouro (embora se pareça muito com ouro). Mesmo se trabalharmos sobre ela, jamais se tornará ouro. A budeidade primordial é apresentada desta maneira a fim de que eliminando as falsas idéias sejamos liberados do apego a crença de que a Base inclui a confusão.
O objetivo é realizar a budeidade primordial, realizar a essência de nossa própria consciência enquanto modos e conhecimentos primordiais.

O ESTADO DO EXTRAVIO
(DA ALUCINAÇÃO). Visão impura
No que se refere ao estado de extravio[‘Khrul-Lugs], "ele é em essência, ignorância, ação cármica e emoção perturbadora, visão falsa e sofrimento".
(Padmasambhava comente agora sua própria afirmativa)
  • Há dois aspectos disso:
- Primeiro, no que concerne à Base da confusão, a mente em-si, a essência do despertar, existe sem nenhuma limitação como ser ou não-ser. Enquanto não reconhecemos isso como nossa própria natureza, acreditamos em ser ou não-ser, nos apegamos a diversas idéias e, assim, existe a confusão.
- Segundo, há a causa [rGyu] que é a ignorância.
- Há cinco aspectos disso:
  1. A ignorância simultânea ou co-emergente é o não-reconhecimento da consciência desperta. Por quem não é ela reconhecida? – Por si mesma. O que é que não é reconhecido? – Ela mesma. Não há ninguém para mostrar as características da causa, e assim é como apalpar uma forma em um quarto escuro. Ou é como não reconhecer que um sinal é um sinal.
  2. A ignorância da imputação total [Kun-Tu brTag-Pa] na qual consideramos o não existente como existente. Quem faz esta identificação? É o nosso próprio processo mental. O que é identificado? Os objetos e a mente estão separados. Como são eles identificados? Enquanto separação entre eu e outros. É como tomar um rótulo por um homem.
  3. As causas que contribuem nos três tipos de ações (três venenos) e nas cinco (ou 6) emoções perturbadoras. Devido as ações virtuosas, nascemos nos reinos superiores dos homens e dos deuses, nesse reino do desejo. Pelo fato das ações inabaláveis, nascemos nos paraísos de Brahma (os reinos sem forma). Pelo fato das ações não virtuosas, nascemos nos três reinos inferiores. Com relação às emoções perturbadoras, por causa do ódio, nascemos nos reinos dos infernos, por causa da ganância no reino dos fantasmas famintos, por causa da estupidez no reino dos animais, por causa da inveja no reino dos semi-deuses, por causa do orgulho no reino dos deuses. E mais, essas emoções perturbadoras são o poder subjacente aos três tipos de ações.
  4. O operador [Byed-Pa-Po] tem um instante de visões falsas. A partir da continuação desse instante, os fenômenos do samsaras e produzem e nos sujeitamos desse modo ao poder do "outro" impuro. Da vacuidade surgem interpretações [sPros-Pa], e por causa disso, acreditamos que a consciência é um "eu" [bDag] substancial.É vendo esse "eu" que o "outro" [gZhan] se desenvolve, e a presença do "outro" dá nascimento à atração, a aversão e a ignorância. Por esse fato, os três tipos de ações cármicas são acumuladas e experimentamos o amadurecimento desse carma.
    Assim, a partir deste instante de visão falsa, outras coisas surgem, igualmente ilusórias. Sobre a Base da percepção de entidades reais, há apego às coisas como se elas fossem permanentes e nos apropriamos dessas noções fixas. É ao olhar assim com confusão que os fenômenos do samsara são criados.
  5. O resultado: o sofrimento. Tomamos um corpo em um dos seis reinos e em cada um desses lugares, experimentamos os diversos resultados das cinco (seis) emoções perturbadoras. Em geral, esta situação é sem começo nem fim, mas ela pode ter um fim.
O estado de extravio é explicado desta maneira por duas razões. Primeiramente, as idéias falsas devem ser eliminadas a fim que sejamos liberados da crença, estabelecida na mente, segundo a qual o extravio está presente na Base. Em segundo, temos necessidade do objetivo que é de podermos realizar a mais pura natureza, porque a Base é livre de confusão.
De resto, como o falso surgimento do extravio apareceu subitamente, se reconhecermos sua natureza, ela então é liberada em seu próprio lugar. Como quando reconhecemos que uma insígnia é uma insígnia, a confusão de a tomar por um homem é liberada na pureza original.

A instrução de apontar o bastão

Apontando o Bastão para o Velho Homem 

Quando o grande mestre Padmasambhava estava no Eremitério da Grande Rocha, em Samye, Sherab Gyalpo de Ngog, um homem sem instrução de 61 anos que tinha a mais elevada fé e forte devoção pelo mestre, serviu-o por um ano. Enquanto isso, Ngog não pediu qualquer ensinamento, nem o mestre lhe deu qualquer um. Quando, depois de um ano, o mestre decidiu partir, Ngog ofereceu-lhe um prato de mandala, sobre o qual colocou uma flor de uma onça de ouro. Então ele disse: Grande mestre, pense em mim com bondade. Em primeiro lugar, eu não sou instrução. Em segundo, minha inteligência é pequena. Em terceiro, estou velho, então meus elementos estão fatigados. Peço que você dê um ensinamento a um velho homem à beira da morte, que seja simples de entender, que possa cortar totalmente a dúvida, que seja fácil de realizar e de aplicar, que tenha uma visão efetiva, e que me ajudará em vidas futuras.

O mestre apontou seu bastão de andarilho para o coração do velho homem e deu esta instrução: Ouça aqui, velho homem! Olhe para a mente desperta de sua própria consciência! Ela não tem forma nem cor, nem centro nem borda. Primeiro, ela não tem origem, mas sim é vazia. Depois, ela não tem lugar de permanência, mas sim é vazia. No fim, ela não tem destino, mas sim é vazia. Esta vacuidade não é feita de qualquer coisa, e é clara e cognitiva. Quando vir isto e a reconhecer, você conhecerá seu rosto natural. Você entenderá a natureza das coisas. Você verá então a natureza da mente, determinará o estado básico da realidade e cortará completamente as dúvidas sobre tópicos de conhecimento.
Esta mente desperta da consciência não é feita de qualquer substância material, é auto-existente e inerente em você mesmo. Esta é a natureza da mente que é fácil de realizar porque não encontrada em qualquer lugar. Esta é a natureza da mente que não é constituída por um percebedor concreto e por algo percebido sobre o qual se fixar. Isso desafia as limitações da permanência e aniquilação. Nisto não há qualquer coisa a despertar; o estado desperto da iluminação é a sua própria consciência, que é naturalmente desperta. Nisto não há qualquer coisa que vá para os infernos; a consciência é naturalmente pura. Nisto não há qualquer prática a ser conduzida; sua natureza é naturalmente cognitiva. Esta grande visão do estado natural está presente em você mesmo: determine que isto não é encontrado em qualquer lugar.

Quando você entender a visão deste modo e quiser aplicá-la na sua experiência, onde quer que você esteja será o retiro na montanha de seu corpo. Qualquer aparência externa que você perceber será uma aparência naturalmente ocorrente e uma vacuidade naturalmente vazia; deixe-a ser, livre de construções mentais. As aparências naturalmente livres se tornarão seus ajudantes e você poderá praticar enquanto toma as aparências como caminho.

No interior, o que quer que se mova em sua mente, o que quer que você pense, não tem essência, mas sim é vazio. As ocorrências de pensamento serão naturalmente liberadas. Quando lembrar da essência de sua mente, você poderá tomar os pensamentos como caminho e a prática será fácil.

Para o conselho mais interior: não importa que tipo de emoção perturbadora você sinta, olhe para a percepção e ela cessará sem deixar rastros. A emoção perturbadora é assim naturalmente liberada. Isto é simples de praticar.
Quando você puder praticar deste modo, seu treino de meditação não será confinado a sessões. Conhecendo que tudo é um ajudante, sua experiência de meditação será imutável, a natureza inata será incessante e sua conduta será inabalável. Onde quer que permaneça, você nunca está separado da natureza inata. Uma vez que você tenha realizado isto, seu corpo material poderá ser velho, mas a mente desperta não envelhecerá. Ela não conhece qualquer diferença entre jovem e velho. A natureza inata está além da inclinação e da parcialidade. Quando você reconhecer que a consciência, o despertar inato, está presente em você mesmo, não haverá diferenças entre faculdades aguçadas ou fracas. Quando você entender que a natureza inata, livre da inclinação ou parcialidade, está presente em você mesmo, não haverá diferença ente um aprendizado grande ou pequeno. Mesmo que o seu corpo, o suporte da mente, caia, o dharmakaya da sabedoria da consciência será incessante. Quando você obtiver estabilidade neste estado imutável, não haverá diferença entre um tempo de vida longo ou curto.

Velho homem, pratique o verdadeiro significado! Leve a prática ao coração! Não permita a fala inútil e tagarelice sem objetivo! Não se envolva em metas comuns! Não se perturbe com a preocupação de ter prole! Não almeje excessivamente comida e bebida. Pretenda morrer como um homem comum! Sua vida está correndo, então seja diligente! Pratique esta instrução para um velho homem à beira da morte!

Por ter apontado o bastão para o coração de Sherab Gyalpo, isto é chamado "A Instrução do Apontar o Bastão para o Velho Homem". Sherab Gyalpo de Ngog foi liberado e atingiu realização.

Isto foi anotado pela princesa de Kharchen [Yeshe Tsogyal] para o bem das futuras gerações. É conhecido pelo nome "A Instrução do Apontar o Bastão".
(Advice from the lotus born: a collection of Padmasambhava's advice to the dakini Yeshe Tsogyal and other close disciples. Introdução de S.E. Tulku Urgyen Rinpoche, tradução de Erik Pema Kunzang e edição de Marcia Binder Schmidt. Kathmandu: Rangjung Yeshe, 1994. Pág. 101-103)

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Quem é Padmasambhava?

Numa ilha no oceano de leite, crescia uma flor de lótus multicolorida, sobre a qual estava sentado um menininho de apenas oito anos, muito belo, ornamentado com todas as marcas maiores e menores, segurando um vajra e um lótus em suas mãos. Ao vê-lo, o rei Indrabodhi ficou maravilhado e perguntou: Pequeno menino, quem é seu pai e quem é sua mãe? Qual é a sua linhagem e qual é o seu país? De que comida você vive e qual é o seu objetivo aqui? Em resposta a estas perguntas, o menino respondeu: Meu pai é a sabedoria do estado desperto intrínseco. Minha mãe é a senhora sempre excelente, o espaço de todas as coisas. Pertenço à linhagem do espaço e estado desperto indivisíveis. Tomei o espaço básico não-nascido como minha terra natal. Sustento-me consumindo os pensamentos dualistas. Meu objetivo é o realizar as ações dos budas…
Certamente, o mais influente dos mestres da escola Nyingma foi Padmasambhava (tib. Pemajungne / Pad ma ‘byung gnas), conhecido pelos tibetanos como Guru Rinpoche ou Mestre Precioso. A tradição diz que ele foi uma emanação do corpo de Amitabha, da fala de Avalokiteshvara e da mente de Shakyamuni. Sua meta específica era a de facilitar a disseminação do budismo naquele período crucial.
De acordo com a biografia escrita por sua discípula e consorte, Yeshe Tsogyal (tib. Ye shes mTsho rgyal), muitos eventos da vida de Guru Rinpoche tiveram vários paralelos com os da vida de Shakyamuni. Assim como o Buda, Guru Rinpoche teve um nascimento milagroso em um pequeno reino, no noroeste da Índia. As histórias afirmam que Guru Rinpoche nasceu no país de Uddiyana (tib. Orgyen / O rgyan) oito ou doze anos após o paranirvana de Shakyamuni.
Sobre um grande lótus multicolorido que surgiu no meio de um lago – o Oceano de Leite -, havia um vajra dourado, marcado com uma sílaba-semente Hrih que tinha sido emanada do coração do Buda Amitabha em sua terra pura, Sukhavati (tib. Dewachen/bDe ba chen). No momento de seu nascimento imaculado, Guru Rinpoche já tinha o desenvolvimento físico de uma criança de oito anos e todas as marcas maiores e menores de um grande ser. Quando o lótus se abriu, Guru Rinpoche estava de pé em seu centro, segurando um vajra e um lótus em suas mãos. (Segundo uma outra versão, para aqueles que não tinham o karma para reconhecer este nascimento milagroso, Guru Rinpoche teria mostrado simultaneamente um nascimento comum, como o filho do rei Mahusita de Uddiyana; ele então teria recebido o nome Danarakshita.)
Indrabodhi (tib. Gyelporaadza / rGyal por rá dza), o grande e generoso rei de Uddiyana, encontrou o menino quando estava retornando da ilha de jóias preciosas da filha do rei naga. Indrabodhi tinha ido até lá com o ministro Krishnadhara a fim de solicitar a jóia que realiza desejos, pois tinha gasto toda a sua riqueza de seus cento e oito tesouros dando esmolas aos pobres. Como não tinha herdeiro, o rei decidiu adotar o menino o deu a ele o nome Rei Padma Vajra (sânsc. Padma Vajra Raja, tib. Pema Dorje Gyalpo/Padma rDo rje rGyal po).
Assim como Shakyamuni, Guru Rinpoche viveu em um palácio, aprendeu as artes e ciências apropriadas aos príncipes e se casou com uma bela mulher, a dakini Prabhavati, (tib. Khadro Öchangma/ mKha ‘gro ‘Od chang ma). Ele passou a ser chamado de Shikhin, Aquele com Turbante. Seu pai adotivo queria que ele seguisse seus passos e governasse o reino, mas Guru Rinpoche percebeu que aquela vida seria de pouco benefício aos outros, particularmente em comparação com o grande benefício que poderia realizar através da divulgação do Dharma.
Guru Rinpoche pediu ao seu pai a permissão para deixar o palácio e seguir uma vida religiosa, mas o rei recusou. Para convencer Indrabodhi a deixá-lo ir, Guru Rinpoche fez uma dança, durante a qual se atrapalhou com um tridente khatvanga e acabou matando o filho de Kamalate, o mais influente dos ministros. Isto é referido como uma “liberação” porque o filho do malévolo ministro morreria em breve por causa do grande karma negativo que acumulou em vidas passadas. Prevendo isso, Guru Rinpoche foi capaz de efetuar a liberação do menino através de seu poder yógico. Porém, isto não foi reconhecido pelo rei nem pelos ministros, e como Guru Rinpoche pretendia, foi exilado do reino e condenado a viver em cemitérios. Após uma emocionante despedida, Guru Rinpoche partiu.
Apesar de isto parecer uma punição dura e opressiva para um aparente acidente, isto satisfez os objetivos de Guru Rinpoche, pois os crematórios eram os pontos de meditação favoritos dos adeptos (sânsc. siddha, tib. drubthob / grub thob) tântricos. Geralmente, os crematórios são lugares sagrados, cheios de significado. São os lugares da extinção do ego e do apego, mas são também locais agradáveis de solitude pacífica, bosques aprazíeis, flores desabrochando, frutas abundantes, aglomerados de pássaros cantantes, leões e tigres domados, céu vasto e aberto, tão altos como se estivessem entre o sol, a lua e as estrelas, sem sistemas ou normas a serem modeladas, livres de distinções e restrições. São lugares onde oceanos dos dakas e das dakinis celebram festins cerimoniais. O rugir dos discursos do Dharma soa em todos os lugares as e luzes da alegria interior do êxtase e abertura estão sempre radiando. Assim, os crematórios são lugares de energia e poder.
Comandando hostes de dakinis, Guru Rinpoche realizou diversas práticas tântricas, desenvolveu seu insight e poder, recebeu ensinamentos e iniciações, além de subjugar espíritos e de convertê-los em protetores do Dharma. Assim, ele se tornou um poderoso yogi. No crematório do Bosque Frio (sânsc. Shitavana), realizou práticas tântricas e teve visões de divindades pacíficas. No crematório de Nandanavana, recebeu iniciações de Marajita, a dakini com face leão que subjuga as forças negativas. No crematório de Sosadvipa, foi abençoado pela dakini Shantarakshita. Guru Rinpoche passou a ser conhecido por esse mesmo nome, Shantarakshita, Preservador da Paz.
Ele então viajou à ilha de Dhanakosha, onde continuou a encontrar dakinis e a intensificar seu insight e seu poder. Guru Rinpoche conversava com elas em sua linguagem simbólica e as trouxe sob seu comando. No crematório da floresta de Parushakavana, realizando práticas tântricas, ele teve a visão pura da dakini Vajravarahi e recebeu suas bênçãos. Com seu grande poder, Guru Rinpoche subjugou as nagas do oceano e os zas do céu. Dakas e dakinis concederam realizações espirituais sobre ele, que passou a ser conhecido como Dorje Dragpo Tsal, Poderosa Ira-vajra.
Depois, Guru Rinpoche foi para Vajrasana (o lugar da iluminação de Buda em Bodhgaya), onde exibiu vários milagres, e então partiu o país de Zahor (em Himachal Pradesh, norte da Índia), onde encontrou o grande Acharya Prabhahasti (Shakyabodhi), de quem recebeu ordenação monástica e o nome de bhagavan Leão de Shakya (sânscr. Shakyasimha, tib. Shakya Senge). Ele aprendeu o Vinaya com o monge Ananda, discípulo e atendente do Buda Shakyamuni.
Apesar de todos tópicos do conhecimento estarem espontaneamente presentes em sua mente, Guru Rinpoche estudou idiomas, medicina, lógica, artesanato e outras ciências, a fim de inspirar confiança nos seguidores comuns. Também estudou toda a gama de literatura e ciência budistas, tornando-se mestre dos textos das tradições exotérica e esotérica e sendo amplamente reconhecido por sua proeza espiritual. Ele recebeu ensinamentos sobre o Yoga-tantra dezoito vezes, tendo inclusive visões das divindades.
Da monja Ananda (tib. Küngamo/dKun ga mo), uma dakini, Guru Rinpoche recebeu a iniciação externa de Amitabha, a iniciação interna de Avalokiteshvara e a iniciação secreta de Hayagriva. Nesta ocasião, a monja deu a ele um nome de erudito – Loden Chogse, Sábia Paixão Suprema. Na stupa de Dechetsegpa, recebeu iniciações das oito mandalas dos vidyadharas Manjushrimitra, Nagarjuna, Humkara, Vimalamitra, Prabhahasti, Dhanasamskrita, Rombuguhya Devachandra e Shantigarbha.
De Budaguhya, Guru Rinpoche recebeu os ensinamentos do Guhyagarbha Tantra e, de Manjushrimitra, recebeu ensinamentos sobre a Grande Perfeição, particularmente o Nyingthig. Em Sosadvipa, durante vinte e cinco anos, recebeu de Shrisimha os três ciclos da Grande Perfeição e o Khandro Nyingthig, atingindo o corpo de arco-íris. Assim, ele se tornou mestre dos ensinamentos das Oito Classes de Atingimento (tib. Drubdegye / sGrub sde brgyad), da Rede Mágica (tib. Gyunp’hül Drowa / sGyu ‘phul drwa ba) e da Grande Perfeição (sânsc. Atiyoga, tib. Dzogchen / rDzogs chen). Guru Rinpoche era capaz de instantaneamente compreender e memorizar quaisquer ensinamentos e textos, mesmo após ouvi-los apenas uma única vez. Ele poderia perceber quaisquer divindades sem nem mesmo propiciá-las.
Em Zahor, Guru Rinpoche encontrou a princesa Mandarava (tib. Mandá ra bá), filha do rei Arshadhara e da rainha Hauki. Mandarava tornou-se sua esposa-sacerdotisa e, durante três meses, realizaram práticas tântricas avançadas na caverna Maratika (caverna Haileshi, em Sagarmatha), no Nepal.
Guru Rinpoche cultivou práticas de longevidade e recebeu a iniciação diretamente de Amitayus (tib. Ts’hepagme / Tshe dpag med), o buda da longa vida. Através desta prática, Guru Rinpoche atingiu o nível de um detentor do conhecimento (sânsc. vidyadhara, tib. rigdzin), tornou-se inseparável de Amitayus e obteve o completo controle sobre a duração de sua própria vida. Já que, através destas práticas, sua forma física era capaz de transcender o nascimento e a morte, ele se tornou efetivamente imortal e nada podia feri-lo.
Ao descobrir que tinham feito práticas de união, o rei ordenou que eles fossem queimados vivos. Mas través de seu poder tântrico, Guru Rinpoche foi capaz de transformar a pira em um lago de óleo de gergelim e permaneceu ileso em seu centro, sentado em um lótus. O rei Arshadhara e os ministros ficaram tão impressionados que pediram para ele ensinar o Dharma. O rei então ofereceu a Guru Rinpoche sua coroa de lótus, seu robe de brocado, seus sapatos e seu reino. Por sua vez, Guru Rinpoche deu ensinamentos ao rei e aos súditos, recebendo os nomes Padmakara e Padmasambhava (tib. Pemajungne), Surgido do Lótus ou Nascido do Lótus.
Depois disso, Guru Rinpoche e Mandarava viajaram para Uddiyana como mendigos. Entretanto, os habitantes reconheceram Guru Rinpoche como o príncipe banido e o mesmo ministro cujo filho foi morto tentou queimá-los em uma pira de sândalo. Guru Rinpoche transformou a pira em um lótus no meio de um lago, permanecendo completamente ileso pelo fogo. Esta exibição impressionou tanto o rei do Uddiyana que ele pediu que Guru Rinpoche se tornasse seu mestre.
Guru Rinpoche estava usando um colar de crânios, simbolizando que ele era um mestre tântrico que libera os seres sencientes do sofrimento da existência cíclica. Por isso foi chamado de mestre Pema Thötreng Tsal, Lótus Poderoso da Guirlanda de Crânios. E como ele tinha sido anteriormente o filho adotivo do rei, passou a ser chamado conhecido como o majestoso e poderoso Rei do Lótus (sânsc. Padmaraja, tib. Pema Gyalpo). Guru Rinpoche serviu como mestre em Uddiyana durante treze anos, durante os quais converteu todo o reino ao Dharma e deu ensinamentos profundos, incluindo o Kadü Chökyi Gyatso.
Guru Rinpoche também disseminou o Dharma nos países vizinhos e se diz que ele emanou o monge Indrasena – responsável pela conversão do rei Ashoka ao budsimo. Também inspirou as pessoas a construir monumentos físicos ao Dharma, tais como stupas (tib. chöten / chos rten), que tanto divulgavam a presença dos ensinamentos quanto marcavam o seu avanço.
As histórias tradicionais da vida de Guru Rinpoche contam inúmeros atos corajosos que ele realizou para banir a oposição e converter os inimigos ao Dharma. Em cada caso, mentes cheias de ódio e rancor foram transformadas em mentes elevadas pela fé no Buda e em seus ensinamentos. Algumas pessoas ofereceram veneno a Guru Rinpoche, mas nada aconteceu. Outros o jogaram no rio Ganges, mas ele passou a ser levado rio acima. Ele passou a ser conhecido como Khye’u Khadeng Tsal, Jovem Garuda Poderoso. Em vários crematórios, como em Küldzog, ensinou os tantras para as dakinis e extraiu a força vital de espíritos poderosos, transformando-os como protetores do Dharma. Passou a ser conhecido como o yogi Suryavamsi (tib. Nyima Özer), Raios de Luz do Sol.
No cemitério de Jalandhara, Guru Rinpoche ajudou a derrotar em debate quinhentos hereges que cercavam Vajrasana, devolvendo a magia negra deles com a prática de Marajita, a dakini com face de leão. Guru Rinpoche também pacificou as vilas e as converteu ao budismo. Os panditas então deram a ele o nome do grande ser irado, Rugido do Leão (sânsc. Simhanada, tib. Senge Dradrog). Na caverna Yangleshö (hoje Parp’hing, no vale de Kathmandu) no Nepal, ele realizou práticas tântricas com a consorte Shakyadevi, filha do rei Punyadhara do Nepal. Guru Rinpoche atingiu a realização das práticas da mandala de Vajraheruka (também conhecido como Shriheruka, Yangdak) e Vajrakilaya. Naquela região havia seca, doença e fome por causa dos espíritos. Então Guru Rinpoche pediu que fossem trazidos textos de Vajrakilaya para a proteção. Quando os textos chegaram, todos os desastres foram pacificados.
No crematório de Sosadvipa, Guru Rinpoche recebeu os três ciclos da Grande Perfeição de Shrisimha, treinou durante três anos e atingiu o corpo de arco-íris da grande transformação. Ele então começou a ampliar o escopo de sua atividade missionária, visitando muitas partes da Índia (como Hurmuja, Sikodhara, Dhanakosha, Rukma, Tirahuti, Kamaru, Rharu, Champakashya, Trilinga, Kanchi e Magadha), a China e o Turquestão. No país de Shangshung, como Tavihricha (Ökyikhyeu), Guru Rinpoche ensinou os ensinamentos do Dzogchen Nyengyü da tradição Bön.
Guru Rinpoche eventualmente decidiu que era o tempo propício para introduzir o Dharma no Tibet. Sua viagem ao Tibet foi uma vitória triunfante sobre as forças demoníacas que estavam determinadas a manter o budismo fora do país. Para estabelecer o budismo no Tibet, o rei Trisong Detsen (790-858, trigésimo-sétimo rei da dinastia tibetana Chögyal) convidou o monge indiano Shantarakshita, monge da linhagem Mula-sarvastivada. Ele era um erudito da filosofia Yogachara-Svatantrika, autor do Madhyamakalamkara (um tratado sobre o caminho do meio) e do Tattvasamgraha (um tratado sobre lógica), e se tornou o o primeiro grande missionário budismo no Tibet. Depois de seis meses no Tibet e de ter começado a construção do monastério em Samye (tib. Sam yas), Shantarakshita encontrou uma oposição demoníaca que voltou as mentes dos ministros contra ele. Os demônios do Tibet, que eram parciais à tradição xamânica do Bön, jogaram relâmpagos do monte Marpori (o lugar onde atualmente está o palácio Potala) e destruíram a colheita. Os deuses e demônios locais se revoltaram e começaram a criar desastres, doença, fomes, seca e tempestades de granizo em todo o país. Os ministros exigiram que Shantarakshita fosse mandado embora do Tibet. Shantarakshita foi para o Nepal e aconselhou o rei a convidar Guru Rinpoche para que viesse subjugar os demônios.
O rei seguiu as instruções de Shantarakshita e enviou emissários a Guru Rinpoche, que já estava sabendo da situação e viajou à fronteira tibetana. Ele chegou no Tibet no ano do tigre de ferro (810), já com mais de mil anos de idade. A neve enviada pelos demônios fez com as passagens ficassem inacessíveis, mas Guru Rinpoche viajou a pé por toda a extensão do Tibet, meditando em cavernas por todo o país, desafiando os espíritos que encontrara em um combate pessoal e os convertendo ao budismo. Guru Rinpoche entrava em uma contemplação meditativa que lhe permitiu subjugá-los e colocá-los sob sua vontade, incluindo as vinte tenmas, os treze gurlhas e os vinte e um genyens. Guru Rinpoche visitou as províncias de Ngari, Ü-Tsang e Dokham, exibindo milagres e atando os espíritos como poderosos protetores do Dharma; nenhum foi capaz de se opor ao seu poder. Tomaram os votos solenes e eternos de nunca trabalhar contra o Dharma e de fazer o máximo para garantir a sua propagação.
O rei, seus ministros e as pessoas comuns ficaram impressionados com o fato de um único homem desafiar todos os demônios do seu país a um combate mortal, e com o fato de nenhum ter poder para impedi-lo. O rei anunciou que, deste ponto em diante, o budismo seria a religião do Tibet e perguntou a Guru Rinpoche o que ele precisaria fazer para facilitar a disseminação do Dharma. Guru Rinpoche aconselhou-o a convidar Shantarakshita a retornar – o que ele fez – e depois disto foi concluído o primeiro monastério budista tibetano, Samye (tib. Sam yas).
Seu pavilhão inferior (representando o nirmanakaya) foi construído no estilo indiano; o pavilhão intermediário (representando o sambhogakaya) foi construído em estilo chinês; e o pavilhão superior (representando o dharmakaya) foi construído em estilo tibetano. Outros templos e stupas foram construídos ao redor, simbolizando uma mandala. Samye tornou-se um importante centro de meditação, veneração, ensinamento, pesquisa e escritura, incluindo bibliotecas e museus. Como um teste, sete tibetanos da família Khön foram ordenados monges e, depois de algum tempo, mais centenas de tibetanos tornaram-se monges.
O rei percebeu que, para que o budismo fosse transplantado ao Tibet com sucesso, as escrituras teriam de ser traduzidas, e assim fundou equipes de tradução que começaram o longo processo de verter os textos do budismo indiano à língua tibetana. Vairochana, Kawa Paltseg, Chokro Lü’i Gyatsen e Shang Yeshe De traduziram sutras e tantras sob a supervisão do abade Shantarakshita, do erudito Shantarakshita, de Guru Rinpoche e do mestre Vimalamitra. Além disso, o rei começou a enviar tibetanos para estudar na Índia e a convidar renomados mestres indianos a visitar o Tibet.
Guru Rinpoche deu ensinamentos e transmissões a centenas de discípulos que se tornaram autorrealizados, destacando-se o rei e os vinte e cinco súditos, os oito adeptos que atingiram o corpo de arco-íris em Yerpa, os cento e oito grandes meditadores do monte Chuwo, os trinta grandes tirthikas de Yangdzong no vale Drag, os cinqüenta e cinco realizados em Sheltrag no vale Yarlung, as vinte e cinco dakinis e as sete yoginis. Com a consorte Yeshe Tsogyal, Guru Rinpoche viajou milagrosamente por todo o Tibet, fazendo práticas, realizando milagres, dando ensinamentos, deixando marcas e abençoando centenas de cavernas, montanhas, lagos e templos como lugares sagrados. Em treze lugares chamados Lar do Tigre (tib. Taktsang), Guru Rinpoche manifestou-se como o ser de louca sabedoria Dorje Drollö , o Vajra Irado Selvagem, atando muitos espíritos como protetores do Dharma. Guru Rinpoche também escondeu milhares de tesouros (tib. terma/gter ma) em vários lugares, a fim de estabelecer o budismo no Tibet, de impedir que as poderosas bênçãos e ensinamentos profundos fossem perdidos, e de beneficiar os praticantes das gerações futuras.
Guru Rinpoche contou com o apoio de grandes consortes de sabedoria, todas elas emanações de dakinis. Mandarava de Zahor era uma emanação de Akasha Dhatvishvari e desempenhava a ação do corpo de Vajravarahi. Yeshe Tsogyal do Tibet era uma emanação de Budalochana e desempenhava as palavras da fala de Vajravarahi. Shakyadevi do Nepal era uma emanação de Mamaki e desempenha a pensamentos da mente de Vajravarahi. Kalasiddhi da Índia era uma emanação de Pandaravasini e desempenhava as qualidades de Vajravarahi. Tashi Khyidren de Mön era uma emanação de Samayatara e desempenhava as atividades de Vajravarahi. Khadro Wongchang desempenhava sua indivisibilidade inefável.
As histórias tibetanas não concordam sobre quanto tempo Guru Rinpoche permaneceu no Tibet para assegurar a difusão do Dharma com sucesso. De acordo com alguns registros, ele permaneceu apenas seis ou dezoito meses, enquanto outros argumentam que ele permaneceu durante três, seis ou doze anos. Alguns afirmam que ele permaneceu por mais de cinqüenta anos.
De acordo com a Declaração de Ba (tib. Bashe / Ba bzhed), a discrepância pode ser explicada – Guru Rinpoche pareceu deixar o Tibet após algum tempo, mas na realidade o Guru Rinpoche que deixou o país era apenas uma emanação criada pelo mestre, que continuava em cavernas solitárias. Em uma análise final, isso provavelmente importa pouco do ponto de vista da tradição, já que ela atribui a Guru Rinpoche inúmeros feitos surpreendentes.
Se estes atos foram realizados em um curto período de tempo, isto é um testemunho de seu grande poder; e se eles foram realizados em um longo período, isso indica a sua grande compaixão e habilidade em supervisionar a transmissão do Dharma. Guru Rinpoche eventualmente deixou o Tibet para continuar seu trabalho missionário nas regiões vizinhas, domando demônios e forças opostas ao budismo. Imediatamente depois de deixar o Tibet, viajou à montanha Küngtang (tib. Gung thang), onde subjugou Tötreng (tib. Thod phreng), rei dos ogres. Durante sua luta, Guru Rinpoche “liberou” Tötreng e, depois disso, entrou em seu corpo. Guru Rinpoche então criou um palácio, que se tornou a base de seu poder entre os ogres. Guru Rinpoche continua a viver na Montanha Cor de Cobre e a se engajar na atividade missionária, pelo benefício de todos os seres sencientes.
Ele é o regente de Vajradhara, cuja presença assegura que a verdadeira essência do Dharma sempre permanecerá no mundo, apesar dos pesares.
Dos livros: Introduction to Tibetan Budism e The Lotus-Born: the Life Story of Padmasambhava

Guru Padmasambhava

Guru Padmasambhava